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Mostrando postagens de dezembro, 2007

Cão sem dono

Não. Este texto não tem nada a ver com o livro ‘Até o dia que o cão morreu’ de Daniel Galera. Nem com a adaptação cinematográfica do mesmo, feita por Beto Brant e Renato Ciasca, intitulada ‘Cão sem dono’. Apesar de ter usurpado o título, estamos falando de outros cães, um sem e outro com dono, como o simpático Churras do livro/filme. Fora isso, a coisa aqui soa meio como ‘meu querido diário’. Quarta-feira passada eu caminhava pela Marginal do Rio Tietê. Aliás, caminhava não, dirigia. Após um dia chuvoso e, todas as pessoas da cidade encantadas pelo fetiche do natal, eu não esperava boa coisa. Imaginava o pior – trânsito, tumulto, compras. Mas até que a ilusória sorte estava ao meu lado, os carros andavam. E justamente por andar, a Marginal fez-me deparar com a segunda cena mais trágica deste ano (obviamente a meu ver). O clima de ‘terra da garoa’ era passado. A quarta-feira estava no seu momento de febre. Com os vidros entreabertos, Herbie Hancock me acompanhava em uma baixa intensidad

Engarrafados

A miragem que o ar seco construira sobre o asfalto era o mais próximo da idéia de inferno que eu havia comprado. Tudo queimava. Sexta-feira, cinco da tarde, São Paulo derretia. Desenhos de um fogo invisível sopravam do chão – como se um maçarico estivesse ligado – desconstruindo qualquer sentimento de término que se tem após mais uma semana paulistana (pelo menos para mim). Eu pregava por um sábado ameno. Descendo o túnel que dá acesso ao Elevado Costa e Silva (nosso popular Minhocão), o mundo parou. Todos inertes – movimentavam-se com cautela. Ao meu redor sobrava um ou outro valente, enxugando o suor na testa e, no máximo, deferindo socos no próprio volante. Meninos se espalhavam entre carros. Forneciam amendoins, limpeza nos vidros, cuspidas de labaredas e, o mais dessemelhante, trazia uma pequenez ímpar – acompanhado por um sorrido puro e estafado. Uma vez vi em um filme que o trânsito é uma guerra de interesses. Você se torna a avenida ou rua por onde circula. Se meu logradouro é

Perdoe-me

Pensava em redigir algo. Parece-me que, quanto mais se pensa, menos realmente se tem meios para começar. Ao me indagar sobre o vento lá fora, o cheiro da chuva que caia e as férias que ainda não atribui utilidade; descobri que não pensava, apenas movia minha mente - como uma engrenagem de automação, ela se move, mas não resolve quando deve se mover. Tinha para mim que o real exercício do pensamento não consistia em passear pelos horríveis jargões das conversas de elevador. Precisava do não habitado, o intacto, o virginal. Só então percebi que, fora contaminado, já havia pensado. Olhava ao meu redor, observava a dupla de donzelas que se encontravam à minha frente e à minha direita. Sentia-me cercado por tudo que gurias com trinta e poucos anos gostariam de ser. A mulher de família, com óculos fundos, um sorriso médio no rosto que demonstra o semblante de quem é a boa mãe, a melhor funcionária do mês ou, para os mais dilatados, a meretriz que facilmente pode ser vista a partir das dezeno

Vivê-se sem pensar?

Àquela hora da noite nada deveria abalar o pensamento de um cidadão padrão. Mas nunca era o que ocorria. Pelo menos, não ocorria, não ocorre e não ocorrerá, quando estou falando de um indivíduo intitulado Eu. A cama e o travesseiro são sempre os companheiros de inúmeros pensamentos que, a esta altura da vida, transformam-se em longas-metragens instantâneos. Pensar é mal humano, não adianta: traz angústia, sensação de nulidade, mostra-lhe uma realidade que nem sempre se quer ver, mas existe, é inevitável. E precisamente esse dia, o pensamento de descrença generalizada me abraçou, descrença da governabilidade sem ética, do desrespeito com o cidadão. As regras estão aí para os mais diversos gostos, ou melhor, as imposições estão aí. Deter o poder nem sempre é sinônimo de obter o respeito da população, eis o problema, se não respeitamos quem nos governa, logo, nada faremos em prol do bem estar coletivo, já que o paradigma é “quem nos governa não o faz”. Vamos a um jantar em sua casa e, apó